quinta-feira, 10 de maio de 2012

Tulipas do Túlio


         Dizem que o universo nos dá uma chance única para conhecermos de perto o que chamam de amor. Na minha história havia um trem, um horário, um atraso e uma perda irremediável. Aquela perda que ninguém quer experimentar, o chute no universo que nos faz desabar, a chance desperdiçada por erros banais, por erros meus.
         Não me lembro de nenhum instante da minha vida que não queria compartilhar com Túlio. Éramos amigos de infância, aquele tipo que se ama mais que tudo, que se protege e que confia. Não deveríamos ter confiado no tempo, ele nos separou com escolas, universidades e cidades diferentes. As mensagens por celular e os telefonemas não bastavam. A memória sumia com o tempo, a saudade era suprida por outras tarefas, outras pessoas.
         Ele me ligou, disse que sentia minha falta, disse que queria me ver. E com o coração palpitando eu mal conseguia responder ao seu pedido. O que não esperávamos é que o tempo se intrometesse novamente, que a mãe de Túlio morresse, que meus estudos decaíssem, que os minutos passassem mais rápido. Logo, o que era um pedido de dias, tornou-se um pedido de meses.
         Túlio me ligou, estava com a voz seca, o ar triste, a fala demorada. Não conseguia reproduzir as palavras. Eu falei por ele. Marquei outro encontro, em outra cidade, com novos ares para esquecer tudo o que havia acontecido nesses últimos meses.
         Lembro-me de ter corrido muito, de ter deixado a cama bagunçada e o café da manhã na geladeira. Lembro-me de ter tropeçado na esquina do trem, e não me importar com isso. Lembro-me de ter visto o trem indo embora, o único do dia, da minha vida. Lembro-me de ter chorado, de ter soluçado, e de ninguém ter perguntado se estava tudo bem.
         O trem passou, e levou junto minhas esperanças, meu amor, minha alma. Com ele ia todas as expectativas de encontrar Túlio, de acariciar o seu rosto agora com a barba crescida, de tocar suas mãos calejadas pelo piano, de beijar a sua boca para que não precisasse emitir mais nenhum som, nenhuma palavra sobre o passado.
         E ali eu fiquei, parada da estação de trem, imaginando Túlio me esperando em outra cidade, com um buquê de flores, ou apenas os seus longos braços para me abraçar. Não me mexi por um longo tempo, as lágrimas ainda caíam em meu rosto, e eu não parava de pensar na chance que havia perdido. Pelo simples motivo que Túlio viajaria para Paris no dia seguinte a trabalho, e só voltaria dentro de um ano. Paris estava muito longe para mim, e eu chorava por tê-lo perdido, novamente.
         E uma mão tocou o meu ombro, meus olhos se abriram com um pouco de dificuldade, e eu podia ver a figura de um homem alto segurando tulipas vermelhas.
         - Pensei que não te veria. – Ele disse em meio a um sorriso.
         Eu me joguei em seus braços, derrubei as tulipas e beijei os seus lábios. Uma sensação muito melhor da que eu imaginava. Ele estava ali, havia pegado o trem de volta para a minha cidade, sentiu-se incomodado quando não me viu no trem que chegou há horas no seu destino. Ele veio por mim e por toda a nossa história, que estava incompleta, mas que ressurgia com traços de ouro.
         - E Paris?
         - Acho que Paris pode esperar até amanhã à noite.
         E ele me beijou novamente, só viajaria no dia seguinte, e a minha casa seria a sua casa por esta noite. Quem sabe por muitas outras que ainda estão por vir. Paris não fica tão longe assim.

1 opiniões:

Ana Carolina disse...

Que texto lindo!
Vontade de morar perto de uma estação de trem para ouvir o seu apito.

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