Nunca pensei em como morreria, se
seria de velhice, de amor ou de amargura. Esperava ser uma morte rápida, não
uma morte estúpida. Eu corria pelo jardim, livre. As gotas geladas do chafariz
caíam sobre mim, sobre o meu vestido carmim, e eu não me importava. Eles
estavam fazendo a coisa mais horrível comigo, obrigar-me-iam a me casar com um
maluco, com um insano, com alguém que eu não amava. Aquele era o meu único e
último momento livre, antes deles me amarrarem a um marido amargo. Nunca pensei
que morreria pelas mãos de um padre, pelas mãos de um casamento.
Nita me olhava pela janela, ela
sentia mais ódio de mim do que o próprio demônio, e tudo aquilo era diversão
para ela. Santa prima que achavam ser assim, mas era um tormento, um estorvo,
uma maldição caída sobre mim, para punir-me de pecados que nunca cometi.
O dia da minha condenação, o dia do
meu casamento. Pela fresta da cortina avistava Sir. Herman com toda a
longitude, vestido com o seu paletó francês, desembarcado na noite passada. Os
convidados esperando, todos em seus lugares, e as cortinas me protegendo de um
pesadelo. Apenas Oliver parecia se importar, procurava-me por entre as pessoas,
estava aflito. Fechei os meus olhos e pedi por um milagre, o único que já havia
requisitado. Oliver surgiu por trás de mim, abraçou-me, com seu cheiro
inebriante e seus cabelos ruivos, acolheu-me nos seus braços quentes, e eu já
não me sentia tão perdida.
- Oliver...
- Lílian, você tem que ir, já estão
preocupados.
-
Oliver, eu não posso.
- Quem dera eu pudesse te tirar
daqui...
Eu o olhei, pude ver a sua alma
clamando por isso, pude ver a minha alma desesperada nos seus olhos. Corri para
fora da igreja, o vestido branco arrastando no chão, Oliver paralisado na porta
e uma grande ponte à minha frente. Não pensei muito, pulei. Senti o corpo
pesado, alguém me puxando, trazendo-me à vida.
Meus olhos se abriram, estávamos na
rua de pedras, ao lado da ponte, todos vestidos a rigor. Ainda era o dia do meu
casamento, e eu não tinha morrido. Triste peça o destino havia pregado em mim,
nem a morte me queria por perto. Sir. Herman me olhava estaticamente, Oliver
mexia nos meus cabelos e seus olhos estavam aflitos.
- Eu estou grávida!
Coragem. Coragem foi a palavra que
melhor definiu o que eu senti. Minha mãe teve uma recaída, meu pai um ataque, e
Nita só me olhava, aplaudindo o teatro.
- Não creio que Sir. Herman se aproximou
de minha pequena filha! – Meu pai já se atracava com o meu noivo.
- Estou grávida do Oliver.
E todos me encararam. Oliver nunca
tinha nem me beijado, eu era virgem de corpo e alma, mas precisava mentir. Ele
me pegou no colo e confirmou a história.
- Eu a levarei comigo.
- De maneira alguma. – Meu pai
gritava.
- Ela precisa descansar, precisa
respirar, falaremos disso mais tarde.
E ele me carregou até a sua casa,
não fomos seguidos ou coisa parecida. Meus pais já não me queriam mais perto,
havia estragado os planos de ser rica com Sir. Herman. Oliver me pôs na cama.
- Por quê? – Ele questionou.
E eu o beijei. Ele me abraçou forte,
enquanto eu o prendia. Os corpos se fundiam, e a sensação de nada era tomada
por um calor. A sua mão afogava-se no meu cabelo negro despenteado, o beijo se
tornava poesia. Os lábios não se separavam, as mãos prendiam-se aos corpos, a
saliva era só uma, o sabor de fruta madura perdurava, e eu tremulava contra ele
enquanto tudo se adocicava.
Eles
descobririam aquela mentira em poucos dias, mas eu e Oliver já estávamos longe,
muito longe de nossa pequena vila. Resolvemos seguir estrada à fora, esquecer o
passado e viver o futuro.
Nunca
pensei em como morreria, se seria de velhice, de amor ou de amargura, mas tinha
certeza que seria com Oliver ao meu lado.
Pauta para Bloínquês, 111° edição conto/história. Tema: frase em negrito.
2 opiniões:
Linda história!
O conto está lindo, criativo, perfeito! Foi muito bem formulado.
Parabéns!
Ana Carolina;
http://realezacontemporanea.blogspot.com.br/
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